O sabo(e)r da vida temperada com o amor

[Leitura] Tg 5, 1-6; Mc 9, 41-50

[Meditação] Conta a história do Irmão Roger de Taizé que, um dia, tendo ele manifestado ao Papa João Paulo II o desejo de se tornar um católico, terá escutado do Santo Padre o pedido, quase mandato, surpreendente «preciso mais de ti como és e como fazes aqui» (na comunidade ecuménica de Taizé). É luminosa esta forma como aquele Pontífice via a força plural da identidade cristã, vivida muitas vezes no meio de extremismos de todo o tipo e das várias latitudes da confissão institucional da fé. Estes “ismos” são sempre aquela “catana” que corta qualquer hipótese de desenvolvimento equilibrado. Nenhum crescimento saudável se compadece de “overdoses”, mas do tempero do amor.

Assim, o evangelista Marcos, tem-nos vindo a conduzir por um fio condutor que é bom seguirmos para compreendermos como se pode “cozinhar” com este tempero do equilíbrio de uma identidade salgada pelo amor cristão. A ação daqueles de quem Jesus dizia não se poder proibir de fazer milagres em nome d’Ele, é considerada por Ele mesmo como necessária e digna de recompensa, porque até benéfica para os que andam mais próximos d’Ele (nem que seja um copo de água!). Acoplando, novamente, a nossa reflexão sobre a história da formação sacerdotal a este fio condutor de Marcos, descobrimos que há mais dois modelos da formação a pedir atenção sobre elementos positivos a reforçar e negativos a evitar, uma vez que os erros que Jesus encontrou nos seus discípulos também se podem repetir hoje. Vejamos:

  1. O modelo da autorrealização é a resposta que o ambiente gerado pelo Vaticano II dá àqueles dois modelos anteriores, a reviravolta antropológica do Concílio. A tendência espiritualista dá lugar à psicologista. Agora é o homem e as suas capacidades que pesam no seu crescimento vocacional, como se os mesmos fossem o fundamento do chamamento. É um modelo positivo porque põe em diálogo a liberdade do homem com a graça de Deus. É negativo porque põe o “eu” no início, no centro e no fim do processo vocacional, e esquece o limite como fonte de graça.
  2. O modelo da pura autoaceitação, ou “módulo único”, aquele que tem como fim uma quase resignação do ser de criatura chamada, por natureza, a transcender-se e o do “módulo único” ou da não-integração como tendência, já na formação e na consequente vivência do ministério, em privilegiar um aspeto ou uma dimensão ou um nível da formação e vivência da vocação, por exemplo o litúrgico, ou o intelectual-escolástico, ou o disciplinar, ou o psicológico, ou até o apostólico. É tremendamente negativo porque leva a perder a visão de conjunto do que se é chamado a ser, mais do que aquilo que foi para nós o formador de maior referência naquele campo. Deste modelo surgiram o espiritualismo, o voluntarismo, o moralismo, o pietismo, o liturgismo, o intelectualismo, o psicologismo, o experiencialismo, o subjetivismo. (Cf. A. CENCINI, L’Álbero della Vita – Verso un modello di formazione iniziale e permanente.)

Estes modelos ajudam-nos a perceber, com realismo, que não vamos muito longe sem a ajuda dos outros: por um lado, o «copo de água» que nos possam dar no árduo caminho; por outro, a nossa abertura aos outros, muitas vezes estragada pelos nossos “ismos” de especialidade douta que, por vezes, de nada servem na hora de, com simplicidade, “mudar uma lâmpada”. Parafraseando o Apóstolo Tiago: de que serve ter ouro se o nosso coração permanecer fechado…?! Em vez de nos sentirmos escandalizados pela abertura da Igreja (p.ex. no Papa Francisco), cuidemos para não escandalizarmos nós com os nossos preciosismos infundados, presunçosamente santos e inúteis para a salvação (nossa e dos outros).

[Oração] Sal 48 (49)

[ContemplAção] Em: twitter.com/padretojo

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