A compaixão é o ajoelhar do coração diante da necessidade fundamental do outro

Heb 3, 7-14; Mc 1, 40-45

É surpreendente o início da vida pública de Jesus, segundo o que nos relata o evangelista Marcos. A sua compaixão que não pede licença a preconceitos para agir imediatamente em favor daquele leproso, a quem, por causa da lepra, tinham tirado cidadania. Surpreende, também, humildade crente de pessoas carentes de um amor incondicional ─ como é o caso daquele leproso ─ necessitado de ser reconhecido tal como é e amado simplesmente por existir. Faz-nos lembrar todos aqueles que, hoje, vivem à margem dos sistemas políticos e religiosos, fechados num limbo por uma barreira de uma ética mal resolvida.

Menos surpreendente é a atitude dos que delimitam uma zona convivencial com um sistema político-religioso, através de uma moral que demora a perceber que a dignidade de uma pessoa é o imperativo categórico pelo qual não há preço a pagar, porque não vale dinheiro, mas unicamente a aceitação da pessoa, distinta do mal que é preciso curar nela, gaste-se o que se gastar. Esta atitude gerava em Jesus um sentimento oposto ao da compaixão: a ira. E se a compaixão O levava a curar sem demora, a ira levava-O a Ele para o deserto, para recomeçar de novo, num projeto divino que, para ter progresso messiânico, teria de implicar ruturas e continuidades em relação ao passado.

No tempo de Jesus, tal como no nosso, existia o perigo de uma sobre-excitação messiânica mal resolvida que derivava num movimento messiânico prematuro. Jesus fugia disto e advertia aos que curava de não o divulgassem, por causa do triunfalismo que isso poderia causar. O ex-leproso quebrou o “segredo messiânico”, aquele que permite “passar por meio dos pingos da chuva” tóxica que corrói a permeabilidade à graça de Deus. Esta é a única que responde e é capaz de colmatar as necessidades mais profundas do ser humano: a nível físico, psicológico e espiritual.

Verdade verdadinha: onde há sistemas (sejam eles de que tipo for) que não permitem a satisfação ou cura no que toca a necessidades básicas das pessoas ─ a nível físico, psicológico e espiritual ─ há ideologias que fogem ao espírito da interdiplinariedade (a nível da Igreja diremos de sinodalidade), com medo de perder a autossuficiência e autorreferencialidade. E está patente o abuso de poder. E quem cai nele habitualmente não deixa que o poder curador da compaixão de Jesus entre nele, para deixar cair prerrogativas humanas que resistem à vontade divina de salvar.

Como nos aconselha o autor da Carta aos Hebreus: é preciso aproveitar a oportunidade única do “hoje” para permanecermos firmes na fé em Jesus e na sua compaixão, acreditando que só Ele tem o poder de nos curar integralmente.

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