Evangelizar é tanto levar Jesus aos outros como enviar os outros a Jesus, formar tanto quanto reformar

Is 45, 6b-8. 18. 21b-25; Sal 84 (85); Lc 7, 19-23

O Advento do Evangelho não nos mostra muito da relação entre os primos João Batista e Jesus, mas aquilo que mostra é suficiente para nos darmos conta de que é uma cumplicidade e uma distância entre os dois, ao mesmo tempo, fatores que não anulam a sua relação como “dobradiça” entre o antigo e o novo testamentos, antes interagem no comum projeto de Deus que é surpreendentemente formador e reformador da história do seu Povo.

Só os vemos juntos no momento fundante da vida pública de Jesus, no rio Jordão, onde a água serve de eixo à articulação entre duas margens, tanto quanto aquela fila de pessoas que se sujeita ao banho de regeneração. Eloquente é também o da concha, cuja charneira abre as duas partes para a abertura a uma luz nova e à contemplação de sua pérola. Durante um tempo, esta se forma dentro da concha, mas passado um tempo, ela terá de ser aberta, para que o que se formou se dê a mostrar. Por isso, evangelizar terá de ser sempre formar e reformar, ajudando a crescer e mostrar, saindo para fora.

É assim a formação cristã, é assim a formação sacerdotal, é assim toda a educação: ajudar a crescer e enviar. Assim fez João Batista com os seus discípulos: enviou-os a Jesus. O seu intuito não seria só curiosidade, nem somente o “grito de um guerreiro”, mas, também, uma pedagogia sábia: abrir mão dos seus próprios discípulos e proporcionando que eles fizessem um “upgrade” na sua forma e objeto de seguimento. Ouvindo de Jesus a confirmação de que era o Messias esperado, ficariam para sempre ligados a Ele.

É assim que, também, vejo o conceito e vivência da minha incardinação como presbítero na minha diocese e na Igreja, à luz do cânone 265 e à luz do Concílio Vaticano II, entre a formalidade e a mudança de mentalidade: por um lado, uma ligação “umbilical” que me dá estabilidade e segurança enquanto sou útil no serviço (cf. cânones 269 e 281); por outro lado, abrindo portas a uma vivência profética do ministério, colocando-me ao serviço ou nunca me fechado à possibilidade de socorrer às necessidades provenientes da responsabilidade que o meu bispo tem de responder a desafios difíceis dentro e fora da própria Igreja particular. A incardinação é, por isso, espaço de formação e de reforma permanente. Se não o fosse, não se estaria “incardinado”, correndo o risco de ser uma porta que não abre nem fecha, porque desligada de a “charneira” que é a autoridade do bispo.

Hoje, a Liturgia faz-nos contactar com S. João da Cruz. A tendência de “encadernar” a vida dos santos de uma forma uniformizante “capa” a possibilidade de contactarmos com o que na sua história é inédito: o caminho do nada se preciso for (como na sua foi) para chegar à novidade do amor de Deus. E quando se fala de “nada” é mesmo nada: nem o físico nem o espiritual. Às vezes, é assim que se faz a reforma da vida espiritual e da Igreja (e das suas instituições): não fazendo “marcha atrás”, mudando somente o lugar onde se (re)enterram os ossos de um fundador, mas um regresso às fontes, para as reler com novos olhares. Não basta anunciar o amor de Deus aos outros, ainda que com palavras afáveis e ações de beneficência; é preciso ajudar os outros a contactar com o amor de Deus como ele se apresenta na sua originalidade por cada pessoa.

Conforme João Batista, o precursor, enviou os discípulos a perguntar ao Messias se era Ele mesmo que havia de vir ao mundo, hoje, a Igreja precursora, é chamada a ir ao encontro da Igreja missionária averiguar a novidade onde o Messias se vai manifestando na sua novidade. Talvez seja este, também, um dos desafios do Sínodo!

O Justo que pedimos que “chova” através do Salmo 84 (85), quando chove, não é para um funil, mas onde quer que Se se manifeste a sua bondade. Ela atrai-nos de onde quer. Por isso, somos chamados a “ver novas todas as coisas”! (St. Inácio de Loyola).

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