Is 30, 19-21. 23-26; Mt 9, 35 – 10, 1. 6-8 ─ Memória de São Francisco Xavier, Padroeiro das Missões
Ai de mim se não evangelizar ─ Bem entendo esta exclamação na boca de Paulo, de São Francisco Xavier e de tantos e tantas, missionários e missionárias ao longo da história, diante do evangelho de hoje, que nos mostra a itinerância imparável, sinodal e universal de Jesus para instaurar ou implantar o Reino de Deus. Na sua ação, conforme nos relata Mateus, entrevê-se um itinerário vocacional daqueles que O acompanham: aos discípulos manda pedir ao Senhor da messe que mande trabalhadores, aos Doze, que Ele chama como hoje os Bispos chamam aqueles que escrutinam para a Ordem, após um tempo significativo de formação, manda realizar atos extraordinários de cura e libertação.
Viemos por povoações de cristãos, que se converteram há uns oito anos. Nestes sítios não vivem portugueses, por a terra ser muitíssimo estéril e extremamente pobre. Os cristãos destes lugares, por não terem quem os instrua na nossa fé, somente sabem dizer que são cristãos. Não têm quem lhes diga Missa e, ainda menos, quem lhes ensine o Credo, o Pai-Nosso, a Ave-Maria e os Mandamentos. Quando eu chegava a estas povoações, baptizava todas as crianças por baptizar. Desta forma, baptizei uma grande multidão de meninos que não sabiam distinguir a mão direita da esquerda. Ao entrar nos povoados, as crianças não me deixavam rezar o Ofício divino, nem comer, nem dormir, e só queriam que lhes ensinasse algumas orações. Comecei então a saber por que é deles o reino dos Céus.
Carta de S. Francisco Xavier em 1542
O Reino de Deus é de que o quer e busca. Ouvi alguém letrado em Teologia e Pastoral dizer, uma vez, que a tendência atual é querermos preparar bem as pessoas para celebrar os sacramentos e, depois de os termos ganho, tender a não acompanhar. Em vez disso, propunha celebrar com as pessoas que assim o querem de livre e boa vontade os sacramentos e, na continuidade, acompanhar os que os recebem no caminho da vida e da fé. Faz sentido, à luz quer do testemunho de São Francisco Xavier, quer do que aprendemos com Jesus Cristo no Evangelho. Diz-nos a sua história que Xavier se dedicou desde cedo às obras de caridade. Não será este voluntariado (boa vontade) que precisamos como fundamento de uma pastoral vocacional mais promissora, em vez de encontros mais ou menos intelectuais fechados sobre si mesmos? A este respeito, urge entrelaçar as iniciativas que já temos na Igreja e monitorizar se o caminho que se propõe a que adere a ele se constituiu como itinerário vocacional.
Como seria ímpio negar-me a pedido tão santo, comecei pela confissão do Pai, do Filho e do Espírito Santo, pelo Credo, Pai-nosso, Ave-Maria, e assim os fui ensinando. Descobri neles grande inteligência. Se houvesse quem os instruísse na fé, tenho por certo que seriam bons cristãos.
Carta de S. Francisco Xavier em 1542
Quanto plantamos uma semente ou uma pequena raiz, não queremos que ali seja imediatamente árvore e fruto. Requer-se tempo, após a sementeira e plantação. Requer-se preparação do terreno, mas se demoramos a semear e plantar, o terreno “foge” da predisposição que possuía para a plantação.
Mas, para o seguimento de Cristo, requer-se acompanhamento, pois
Muitos deixam de se fazer cristãos nestas terras, por não haver quem se ocupe de tão santas obras. Muitas vezes me vem ao pensamento ir aos colégios da Europa, levantando a voz como homem que perdeu o juízo e, principalmente, à Universidade de Paris, falando na Sorbona aos que têm mais letras que vontade para se disporem a frutificar com elas. Quantas almas deixam de ir à glória e vão ao inferno por negligência deles! E, se assim como vão estudando as letras, estudassem a conta que Deus Nosso Senhor lhes pedirá delas e do talento que lhes deu, muitos se moveriam a procurar, por meio dos Exercícios Espirituais, conhecer e sentir dentro de suas almas a vontade divina, conformando-se mais com ela do que com suas próprias afeições, dizendo: «Senhor, eis-me aqui; que quereis que eu faça? Mandai-me para onde quiserdes; e se for preciso, até mesmo para a Índia».
Carta de S. Francisco Xavier em 1542
Não é infrequente, para os que “habitam” as comunidades da Igreja, querer-se ou pedir-se serviços cómodos ou mais vistosos, onde sustentar um protagonismo que dê segurança emocional e reconhecimento que acaba por ser “pago” de alguma forma. Chega a haver, já, bons estudos de psicologia sobre isso, que servem de prevenção e de cura!
Urge a necessidade de discípulos-missionários preparados e animados em ser enviados para as periferias, não só para ensinar, mas também para cuidar, curando as pessoas nas situações mais diminuidoras da dignidade e felicidade humanas. Pelo que se percebe nesta crónica, muitas vezes se “fica pelas palavras e não aponta ações concretas para combater estas ameaças. Como nos diz o Papa Francisco na sua mensagem para o Dia Mundial dos Pobres ‘não servem retóricas, mas arregaçar as mangas e pôr em prática a fé através dum envolvimento direto’. Eu por cá [diz o Papa] vou tentar arregaçar as mangas…’.
São Francisco Xavier é um daqueles exemplos em que a prática da caridade e o ensino são partes da mesma entrega e ação missionária, imitando o próprio Cristo.
Ajudar-nos-á a imitar, também, assim a opção de Jesus pelos mais desfavorecidos, voluntariando-nos e envolvendo outros, a partir da intenção de oração neste mês de dezembro: por organizações de voluntariado e de promoção humana que se comprometam pelo bem comum.