Perdão e compaixão, “arco e corda” para uma “flecha” verdadeiramente livre
Ez 12, 1-12; Sal 77 (78); Mt 18, 21 – 19, 1
Como Santa Clara, antes de conhecer São Francisco de Assis, todos os seres humanos nasceram e cresceram num contexto natural e relacional de presenças e ausências que delimitaram “o arco” e determinaram a tensão da “corda” com que cada um foi lançado na e para a vida.
Eles tentaram e ofenderam o Altíssimo
e não observaram os seus mandamentos.
Foram infiéis e renegados como seus pais,
como flecha errante, desviaram-se do caminho.
Sl 77 (78), 56-57
Estes dois versículos do Salmo 77 (78) trazem à nossa meditação a possibilidade de um ser humano ser, percebendo-se ou não, como “flecha errante”. Nesta tradução, a causa do desvio recai sobre a orientação da própria flecha; na tradução da CEP (cf. http://conferenciaepiscopal.pt/biblia/index.php/Sl_78), a causa do desvio recai sobre o “arco sem força”.
Seja como for, o Evangelho possibilita ao ser humano a mudança quer de arqueiro, quer de arco e corda, quer de tensão, quer de direção, sem ignorar o contexto em que cada ser humano nasceu e cresceu. No entanto, o Reino de Deus é a direção ou o alvo para o qual o Arqueiro nos quer dirigir; o arco é o perdão cuja corda se tange com a força da compaixão.
A verdadeira liberdade deverá ser considerada primeiramente livre de determinismos que condicionem a possibilidade de um recomeço feliz para quem se transviou ou se sentiu errante. Todo o ser humano tem o direito (divino) a sentir-se incondicionalmente amado, como ponto de partida ou de repartida para o horizonte objetivado como o realmente promissor de verdadeira felicidade.
No caso de Clara de Assis, desde cedo que se sentia atraída a praticar a caridade. Porém, o contexto familiar de nobreza e riqueza que lhe queria proporcionar um casamento vantajoso não era o melhor. Para tal, abandonou o seu lar para abraçar a vida de pobreza inspirada em Francisco de Assis.
O Reino de Deus é um Reino de perdoados capazes de se compadecer e perdoar. Para o atingirmos, teremos sempre de partir sempre, da herança natural que recebemos para a herança sobrenatural que nos está prometida. A paciência de Deus será sempre o pano de fundo desta aventura misteriosa.