Nascer de novo é deixar que o Espírito do Ressuscitado nos ajude a passar das dores à alegria

At 4, 23-31; Jo 3, 1-8

Hoje, segunda-feira de pascoela, em Braga, celebra-se Nossa Senhora dos Prazeres ou da Alegria. Rui Ferreira afirma que com o objetivo de assinalar o gozo de Maria após percecionar a ressurreição do seu filho em contraponto com a dor sentida aos pés da cruz, esta celebração litúrgica terá sido introduzida por iniciativa do Arcebispo D. Frei Bartolomeu dos Mártires em 1566. E que: apesar dos Evangelhos não confirmarem a aparição de Jesus Cristo a Maria após a ressurreição, é um facto que esta presumível aparição de Jesus Cristo a sua mãe já era usual na tradição cristã oriental, de onde aliás provém a inclinação mariana do cristianismo. No século VI, já São Romano, o melodista (?-c. 560), comenta no seu “Hino 25” um putativo diálogo de Cristo com Maria aos pés da cruz no qual refere: «Descansa, Mãe, serás tu a primeira a ver-Me sair do túmulo». Também Santo Inácio de Loiola, no seu livro dos Exercícios Espirituais, na primeira contemplação na semana em que propõe a meditação de Cristo ressuscitado é precisamente a Maria, concedendo-lhe um protagonismo que as próprias narrativas evangélicas não lhe concedem: «Apareceu à Virgem Maria; o quem ainda que se não diga na Escritura, se tem como dito, ao dizer que apareceu a tantos outros». Também o Papa João Paulo II o sublinha, afirmando que é “legítimo pensar que, de modo semelhante a Mãe tenha sido a primeira pessoa a quem Jesus ressuscitado apareceu”. Aliás, a ausência de Maria do grupo das mulheres que ao alvorecer se dirige ao sepulcro (cf. Mc. 16, 1; Mt. 28, 1), não poderia talvez constituir um indício do facto de Ela já se ter encontrado com Jesus?”. Enfim, parece razoável pensar que Maria tenha tido um contacto pessoal com o Filho ressuscitado, para gozar também ela da plenitude da alegria pascal.

Nossa Senhora da Alegria, que encontramos em Aboim da Nóbrega, que apresenta a mãe de Jesus com vestes e expressão rejubilante a tocar uma viola ou cavaquinho. A imagem de Nossa Senhora das Dores aí venerada é coroada solenemente após lhe serem retiradas cada uma das sete espadas. A cerimónia finda com a coroação da imagem, retirando-se o resplendor e colocando-se uma coroa real. Os sinos repicam e vivencia-se a alegria da ressurreição. A imagem permanece sem as suas “dores” durante todo o período pascal. A imagem de Maria despindo-se das suas dores e experimentando a alegria do Cristo ressuscitado durante o tempo pascal deveria ser um convite vigoroso a uma vivência mais intensa deste especial tempo proposto aos cristãos e ainda experimentado na Arquidiocese de Braga e em algumas outras comunidades em Portugal. A devoção de Nossa Senhora da Alegria é um contraponto muito oportuno à evocação das Dores de Maria, que certamente justificaria uma popularidade mais assinalável nas práticas devocionais e na própria liturgia.

De Nossa Senhora das Dores para Nossa Senhora dos Prazeres coroada de Alegria, porque Jesus passou da morte para a vida definitivamente. Este processo é, impreterivelmente, assimétrico ao do crescimento da pequenez para a adultez meramente natural:

enquanto a geração na ordem natural, realizada no seio da mãe, se expande numa separação progressiva até a criança ser capaz de viver uma vida independente e perfeita, a geração espiritual faz-se em sentido inverso, por uma progressiva absorção na unidade. Separados de Deus pelo pecado, somos iluminados pela sua luz, ficamos presos nos laços cada vez mais estreitos do seu amor, até que, tornados verdadeiras crianças, nos percamos no seu seio, vivendo só da sua vida e do seu Espírito. Os que são movidos pelo Espírito são verdadeiramente filhos de Deus» (Rom 8,14); são aqueles que, pela sua pobreza espiritual e o seu desprendimento de si mesmos, perderam as suas operações próprias e entraram no seio de Deus, onde a sua vida e os seus movimentos dependem em tudo do Espírito que gera para a vida. Tal é o sentido e o valor da infância espiritual. Realizada na perfeição, ela já é santidade.

Beato Maria Eugénio do Menino Jesus (1894-1967), carmelita, fundador de Notre Dame de Vie, falando sobre “O comportamento da alma”.

Todos somos convidados a nascer de novo. Este nascer de novo começa com o Batismo, mas jamais termina, porquanto é necessário, cada vez mais e melhor, fazermo-nos pobres. Para renascermos pelo sopro do Espírito é preciso ser pobre, confiante e dependente em tudo de Deus.

Quem aconteça em nós como aos Apóstolos: que em todas as vicissitudes não encontremos senão razões para invocar a Deus e anunciar com firmeza a Palavra de Deus, sob a graça do Espírito Santo.

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