Mt 5, 1-12aNo IV Domingo do Tempo Comum A

O discurso das Bem-aventuranças permanecerá para sempre um programa de vida no qual Jesus insere a sua atividade pastoral, identificando-se com os seus destinatários. Esta identificação é notória pela colocação dos sentidos e pela posição corporal, conforme nos confirma o versículo 1: Naquele tempo, ao ver as multidões, Jesus subiu ao monte e sentou-Se. Rodearam-no os discípulos…

Chamamos este discurso programático no tocante à missão de Jesus porque não parte de cima, quer dizer, de um método dedutivo, mas de baixo, indutivamente, desde a observação da vida real das pessoas e como resposta de saída para a sua saúde física, psíquica e espiritual. Segundo Mateus, este mesmo discurso acontece após a escolha dos primeiros discípulos e o acorrer das multidões ao encontro do Mestre (cf. cap. 4). Jesus, colocando-Se ao nível das outras pessoas, observa-as e ajuda-as a tirar de si o remédio que as cura para a vida eterna.

Lembra-nos o Papa Francisco que com este discurso Jesus mostrou-nos a essência do que é ser santo, diante de muitos modelos difíceis ou inacessíveis de a santidade ser procurada ou conseguida. “À luz do mestre” a proposta de santidade depende mais da forma como vivemos as circunstâncias da nossa situação pessoal e comunitária, diante dos problemas do mundo. Enquanto que a realidade do mundo tende a fascinar-nos com outro estilo de vida, Jesus dá-nos o Seu Espírito, para “nos permear com toda a sua força e nos libertar da fraqueza do egoísmo, da preguiça, do orgulho”. Com as suas palavras, Jesus convida-nos a aproveitarmos a situação que vivemos, neste tempo, para deixarmos acontecer uma mudança real.

Segundo o Papa Francisco, à luz da Carta Apostólica “Alegrai-vos e exultai”, a santidade ou felicidade cristã, à luz das Bem-aventuranças, podem traduzir-se assim ─ Santidade é:
1) Ser pobre no coração
2) Reagir com humilde mansidão
3) Saber chorar com os outros
4) Buscar a justiça com fome e sede
5) Olhar e agir com misericórdia
6) Manter o coração limpo de tudo o que mancha o amor
7) Semear a paz ao nosso redor
8) Abraçar diariamente o caminho do Evangelho mesmo que nos acarrete problemas

E a grande regra de comportamento da santidade que agrada a Deus é praticar as obras de misericórdia contidas no Capítulo 25 de São Mateus.

Portanto, não há aqui só uma proposta de felicidade contracorrente, mas também uma proposta de santidade contracorrente, na atitude de Jesus diante dos males que atribulam a vida das pessoas. Por excesso ou por defeito, pode haver propostas de santidade e felicidade que obstaculizam um caminho realista para Deus e a vida do Reino que Ele nos propõe. Está a fazer 80 anos o famoso livro de Saint-Exupéry, O Pricipezinho, que pela sua simplicidade e beleza deixou perfume em milhares de leitores ao longo de todos os tempos, cativando pela convergência de palavras, símbolos e figuras em relação à vida das pessoas. E não deveria ser assim e muito mais, também, a nossa relação com a Palavra que é Cristo: a de uma santidade e felicidade “façonnable“, quer dizer, “moldável” ou acomodada à situação de cada pessoa, de forma a que cada pessoa possa fazer o seu caminho de forma realista para Deus e para os irmãos? Foi esse o método que o Senhor Jesus utilizou ao encarnar. Como não haveria de ser o nosso como discípulos-missionários?

Uma certeza em que somos chamados a estar unidos: no coração de Deus, todos partimos de um plafond infinito de amor. Em cada pessoa, Ele quer ver uma felicidade original e não a fotocópia própria de quem se deixa levar por modas de felicidade genéricas, manipuladas pelo consumismo.

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