In bocca d’oro! Viva!

[Leitura] 1 Cor 12, 12-14. 27-31a; Lc 7, 11-17

[Meditação] Na cultura italiana costuma-se desejar boa sorte com a expressão «in bocca al lupo». No fundo, trata-se de desejar, ironicamente, algo de bom dizendo uma expressão contrária, como no inglês «break a leg» (parte uma perna). Não ouso aqui incluir a versão portuguesa, muito utilizada entre (alguns) músicos… Portanto, na vida social costuma-se usar a ironia para, contrariando a ocidental “Lei de Murphy” (qualquer coisa que possa correr mal, ocorrerá mal), apoiar a probabilidade de acontecer o bem. Sublinha-se, assim, a importância da sorte, menosprezando o esforço das pessoas.

«Boca de ouro» foi a definição dada a S. João Cristóstomo, pela sua eloquente pregação, contrariamente ao jogo humano de deitar a vida “à sorte”, que tentou colocar sempre a par do Evangelho a realidade da vida humana, como se vê por uma parte das suas famosas homilias:

Você deseja honrar o corpo de Cristo? Não o ignore quando ele está nu. Não o homenageie no templo vestido com seda quando o negligencia do lado de fora, onde ele está mal vestido e passando frio. Ele que disse “Este é o meu corpo” é o mesmo que diz “Tu me vistes faminto e não me destes comida” e «quantas vezes o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes» (Mateus 25, 40)… Que importa se a mesa eucarística está lotada de cálices de ouro quando seu irmão está morrendo de fome? Comeces satisfazendo a fome dele e, depois, com o que sobrar, poderás adornar também o altar.

João Crisóstomo, Comentário sobre Mateus

Por estes dias, o Bispo de Setúbal proferiu as mesmas “palavras de ouro” ao evocar a Igreja de celebrações «ritualmente perfeitas» mas onde falta a atenção à fome e ao abandono. Hoje, precisa-se de “dragões” que mandem labaredas do “ouro”, Profetas que desobstaculizem o caminho da Palavra divina a reivindicar a realização do verdadeiro culto pela justiça de Deus que é a sua infinita misericórdia. Lá onde, como Crisóstomo diante da imperatriz bizantina Élia Eudóxia, se corre o risco de viver exilados pagando o “preço de ouro” pela própria vida em favor dos pobres e abandonados.

Entre os católicos, trabalha-se muito, por vezes, a esforçar-se a fugir do mal, supostamente “onde haverá dragões (de morte)” que se devem temer. Realiza-se a vida cristã, maioritariamente, pela via negativa, como representa a procissão fúnebre daquela mãe que sai da cidade para sepultar o seu único filho. Seguindo outra via, a da humildade e fé no perdão de Deus que dá vida, há quem (porventura uma minoria dos que se dizem “católicos”) ousam ser, eles próprios “dragões de vida” corajosos a aproximar-se do mal para o confrontar com as palavras do Bem, onde ele não é politicamente correto. Optam pela via positiva, como a do caminho proposto por Jesus ao cruzar-se com a viúva de Naim, a caminho da cidade.

Ao “lobo” da má sorte, os italianos respondem: “Crepi!”, quer dizer, morra o lobo! Ao “crisóstomo” que defende a justiça de Deus aplicada aos pobres, diante dos “lobos” deste mundo, que não deixam de ser membros do mesmo corpo a restabelecer, respondemos: “Viva!”

[Oração] Sal 99 (100)

[ContemplAção] Em: twitter.com/padretojo

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