Lutar: as possibilidades, os limites e a fronteira

Nunca mais me sai da memória a oração: «Meu Deus, dai-me serenidade para aceitar as coisas que não posso mudar, coragem para mudar as coisas que posso e sabedoria para perceber a diferença», atribuída a Friedrich Oetinger (1702-1782) e a Reinhold Niebuhr (1934). Esta oração é aconselhada pelos psicólogos humanistas que acreditam no poder do relaxamento e meditação como ponto de partida para uma psicoterapia cognitiva e comportamental. Podemos dizer que é um dos fundamentos psicoterapêuticos necessários para que a pessoa possa ser feliz e buscar o sentido da sua vida, mesmo diante de uma consciência marcada por desgostos e desilusões, para além das bem-vindas sensações agradáveis da vida.

Creio ser esta a diferença que existe entre um “santo alegre” e um “triste santo”: lutar por mudar aquilo que se descobriu ser capaz, com as ajudas necessárias, mudar. Quantas  vidas marcadas pela luta amarga provocada por esforços inúteis em tentativas de mudança de aspectos da existência pessoal que nunca mudarão e somente poderão ser integrados no todo belo que é a pessoa? Aceitar serenamente será o melhor remédio!

Quanto cepticismo por coisas que realmente se poderão mudar quando se procura a ajuda necessária, nos diversos ramos do saber (físico, psicológico, espiritual), levando a pessoa a estabilizar-se numa identidade, ao invés de carregar fardos que não levam a nenhum calvário glorificador? Tenha-se a coragem de procurar ajuda e esforçar-se por fazer ginástica, uma terapia, ou a ascese!

Penso, no entanto, que o drama maior será descobrir aquela diferença fundamental: o que é que em mim, na minha vida, ou à minha volta não posso mudar e terei que aceitar, seja coisa má, ou até ruim (ninguém quererá mudar coisas boas!)? O que é que será, no quadro das coisas mais desagradáveis, aquelas que realmente já encontraram cura acessível à maioria das pessoas? Como posso fazer para descobrir essa diferença?

Creio ser, então a meditação, o relaxamento, a oração, dependendo do credo da pessoa, sobre o próprio ser, sobre as pessoas e sobre o mundo que a rodeia, uma via para se encontrar aquela diferença. Uma vez encontrada, ainda que seja em medidas minuciosas, quase insignificantes, mas que fazem muita diferença quando “fala” o nosso ser que não controlamos, então é hora para unir as peças do puzzle do nosso ser pessoal, evoluindo da fragmentaridade para a unidade de vida, em que tudo – o que não se pode mudar, o que se pode, a dúvida e a sabedoria – se integra num projecto de vida.

Não se deve gastar a vida a lutar pelo que não se pode mudar; há que fechar numa fronteira, se os seus sintomas são desconfortáveis. Não se devem perder as oportunidades para iniciar um processo de mudança dos aspectos que podem ser mudados; há que transpor as fronteiras do “politicamente correcto” para o alcançar. Em todo o caso, há que procurar permanentemente a sabedoria que nos ajude a construir essa fronteira pessoal flexível, não rígida (é necessária esta tautologia!), suficientemente maleável para que possa também possibilitar a expansão do próprio ser, através da auto-transcendência, em busca daquela imagem que nos faz semelhantes a Deus.

%d bloggers gostam disto: